Procedimentos Estéticos e o Uso Excessivo de PMMA: Responsabilidade Médica em Questão – Dolo Eventual ou Homicídio Culposo?

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Procedimentos Estéticos e o Uso Excessivo de PMMA: Responsabilidade Médica em Questão – Dolo Eventual ou Homicídio Culposo?

O Brasil ocupa uma posição de destaque no ranking de países que mais realizam cirurgias plásticas estéticas no mundo, e o uso de substâncias arriscadas em tais procedimentos é uma realidade cotidiana. Quando um paciente falece após uma cirurgia, surge a questão: o médico deve ser acusado de homicídio culposo ou dolo eventual?

 

O mercado da estética no Brasil é altamente lucrativo, e uma variedade de profissionais de saúde, além dos médicos, realiza procedimentos estéticos. Esse fenômeno é impulsionado pela pressão social que define padrões ideais de beleza, especialmente para mulheres e jovens, que buscam intervenções estéticas desde a adolescência. O Brasil é o segundo país do mundo em número de cirurgias plásticas estéticas, ficando atrás apenas dos Estados Unidos.

 

Legalmente, a realização de procedimentos estéticos eletivos relacionados ao aprimoramento físico está sob a jurisdição dos médicos. A decisão de prosseguir com um procedimento é baseada no consentimento informado e livre do paciente, de acordo com o princípio da autonomia. Isso significa que, se o paciente compreender os riscos após ser informado e consentir com a intervenção, o médico está autorizado a proceder. A falta desse consentimento pode levar a acusações de constrangimento ilegal e lesão corporal.

 

Para garantir a segurança dos pacientes, existem normas técnicas (lex artis) que orientam a conduta dos profissionais de saúde. A conformidade com essas normas pressupõe que o profissional atue dentro dos limites de risco permitidos e aceitáveis. No entanto, quando esses limites de risco são ultrapassados e a conduta do médico é questionável, ele pode ser responsabilizado em várias esferas: ético-disciplinar perante o Conselho Regional de Medicina, civil com o pagamento de indenização, e até criminal, se houver suspeita de um delito.

 

Consideremos um caso hipotético baseado em fatos reais: Uma paciente de 30 anos, chamada de A, decide realizar uma cirurgia para aumentar os glúteos e procura um médico famoso, B, que tem uma grande presença nas redes sociais. Eles acordam o valor dos honorários, e um termo de consentimento é assinado. No dia da cirurgia, o médico B opta por usar polimetilmetacrilato (PMMA) em excesso, aplicando o dobro do volume autorizado pela ANVISA para fins estéticos. Além disso, o médico não informa à paciente sobre a substância utilizada e seus riscos. Dois dias após a cirurgia, a paciente desenvolve uma infecção generalizada e morre devido a uma embolia pulmonar causada pelos efeitos do PMMA em seu organismo.

 

A família da paciente fica intrigada com a morte súbita e inicia uma investigação, registrando um boletim de ocorrência. A polícia passa a investigar o médico B por homicídio, alegando que sua conduta foi a causa da morte da paciente A. Após uma perícia, fica claro que a causa da morte foi o uso excessivo de PMMA. O Ministério Público denuncia o médico sob a alegação de dolo eventual, pois ele agiu de forma indiferente ao risco de morte da paciente que confiou em seus serviços. Além disso, a família da vítima apresenta uma queixa ao Conselho Regional de Medicina e entra com uma ação de reparação de danos alegando erro médico. Agora, surge a pergunta: a conduta do médico constitui dolo eventual ou culpa?

 

A questão da responsabilidade do médico pode ser abordada em diferentes ramos do Direito. A infração ao Código de Ética Médica pode resultar em uma investigação e processo ético-profissional. Além disso, a responsabilidade civil do médico pode ser considerada se houver evidência de conduta negligente, incluindo negligência, imprudência e imperícia, além de um nexo causal e danos sofridos pelo paciente.

 

No que diz respeito ao Direito Penal, a análise da responsabilidade criminal do médico deve ser realizada com cautela. É importante considerar não apenas a relação causal entre a conduta do médico e a morte do paciente, mas também o elemento subjetivo, ou seja, se o médico agiu com dolo ou culpa. O dolo pode ser direto, quando o agente quer o resultado, ou eventual, quando o agente assume o risco de produzir o resultado, mesmo que seja indiferente a ele. A culpa, por outro lado, ocorre quando há violação de um dever objetivo de cuidado previsível, resultando em um resultado previsível que poderia ter sido evitado.

 

No caso do médico B, sua conduta se destacou pela utilização excessiva e inadequada do PMMA, uma substância que não é recomendada para procedimentos estéticos por várias entidades médicas respeitáveis. Além disso, o médico não informou à paciente sobre a substância utilizada, aumentando os riscos inerentes a ela. Como especialista, o médico tinha o dever de compreender os riscos e, mesmo assim, escolheu agir de forma indiferente ao risco de morte da paciente. Ele também negou à paciente o direito de recusar o procedimento, privando-a da oportunidade de tomar uma decisão informada sobre os riscos envolvidos.

 

Portanto, é possível argumentar que a conduta do médico B foi caracterizada por dolo eventual, pois ele agiu de forma indiferente e assumiu o risco de causar a morte da paciente. No entanto, a imputação subjetiva ao agente dependerá das circunstâncias do caso específico e das provas apresentadas.

 

Em conclusão, a responsabilidade médica deve ser analisada com base nos princípios do Direito Penal democrático e no respeito à dignidade da pessoa humana. A acusação automática do profissional de saúde não deve ser tolerada, e a imputação subjetiva, seja dolo ou culpa, deve ser determinada com base nas evidências disponíveis. No entanto, em um cenário onde procedimentos estéticos e o uso de substâncias potencialmente perigosas se tornam cada vez mais comuns, os médicos devem agir com extrema cautela, aderindo estritamente às diretrizes e normas de segurança médica. A segurança e a saúde dos pacientes devem ser prioridade máxima.

 

Além disso, é crucial que as autoridades regulatórias e as organizações médicas continuem a esclarecer e reforçar as normas e orientações relacionadas a procedimentos estéticos. Isso inclui a restrição ou proibição de substâncias consideradas perigosas, como o PMMA em certos procedimentos, bem como a exigência de um consentimento informado abrangente e detalhado. A proteção do paciente e a garantia de uma prática médica ética devem ser os principais objetivos.

 

No caso discutido, a aplicação de PMMA em excesso sem o devido consentimento e informação clara para a paciente resultou em uma tragédia, levantando questões importantes sobre a responsabilidade do médico envolvido. A resposta para a pergunta sobre dolo eventual ou homicídio culposo pode depender das circunstâncias específicas do caso e da interpretação das leis pertinentes.

 

Em última análise, a discussão em torno de procedimentos estéticos, ética médica e responsabilidade legal destaca a importância de um diálogo contínuo entre profissionais de saúde, autoridades regulatórias e pacientes. A busca por padrões mais elevados de segurança, ética e responsabilidade médica deve ser um objetivo comum para todos os envolvidos, a fim de proteger a saúde e o bem-estar daqueles que buscam aprimoramento estético.

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Equipe Seguremed

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